sexta-feira, 16 de outubro de 2009

"Pela luz dos olhos teus"

Decidi que por algumas horas iria decifrar o olhar de cada pessoa que lhe passasse por perto. Iria observar, tirar a primeira impressão e dilatar minhas pupilas até o momento em que deduziria o que aqueles pares de olhos tentavam dizer ao cruzarem com os meus. Percebi alguns tipos interessantes.
O primeiro, olhar cabisbaixo, olhar que desejava não desempenhar sua função naquele momento. Era melancólico, desistente.Simplesmente não queria se abrir para a vida, mas sim se afundar debaixo de lágrimas. Deu algumas piscadas e se foi.
Havia também o olhar sereno. Manso, pacífico. Transmitia algo quase que misterioso ao mesmo tempo que era despreocupado e esperançoso.
Veio então o olhar rancoroso, vermelho. Estava sempre coberto pela sobrancelha, sua capa protetora que o diminuia. Ele não queria me fitar nos olhos, piscava demoradamente, até que esse ato tornou-se rápido à medida em que o par de olhos raivosos encontravam o olhar amoroso. Esse sim era belo. Era doce, respeitável e desfilava por uma passarela azul-piscina. Quando cruzou com o olhar rancoroso, o transformou. Este clareou-se, tornou-se vulnerável e desesperado, enquanto aquele, sem se desviar, se aproximou e se refletiu no olhar em metamorfose.
Passou por ali também o olhar desconfiado, direto em minha direção. Analisou o contorno do meu e fez pouco caso do que viu. Remexeu-se, procurou algo inexistente e misteriosamente largou sua busca.
O que fez o meu olhar ficar assustado e curioso mesmo, foi o olhar alegre. Este brilhava, piscava, dançava. Vagava em busca de algum que precisasse da sua luz. Fitou-me. Era tão lindo, tão grande... que de tão grande ficava pequeno dentro do seu espaço, pois o seu vizinho de baixo, o sorriso, queria crescer tanto que impulsionava as bochechas em direção a ele e assim lhe diminuia, e lhe aumentava de expressão. Então senti que aquilo era contagiante e que muitos ao observar aquele olhar, contraiam os mesmos sintomas. Inclusive eu.
Foi assim que concluí que o olhar, além de janela da alma, é o espelho principal do coração. Consigo desvendar o amor, o que se esconde atrás do rancor e o motivo de qualquer dor. Posso descobrir verdades, entender desconfianças e até deduzir um ar traiçoeiro. Posso até oferecer ajuda ou recusar alguma. Ou então, deixar-me levar por ele e ser conduzida à uma sensação. Mas mais do que isso, descobri que um olhar tem o poder da mutação. Ele pode muito bem causar uma transformação com um simples piscar ou um fitar envolvente. Ele acaba com relacionamentos ou solidifica um amor. Pode remexer-se a ponto de tontear quem lhe observa. Pode construir um mundo a partir das próprias interpretações e reagir através daquilo que enxerga. Pode ser engraçado, pode ser medroso, pode ser tristonho. Pode desmentir palavras, pode pedir desculpas, pode prever o futuro.
Basta um olhar e seu caminho está nítido.
"A candeia do corpo são os olhos; de sorte que, se os teus olhos forem bons, todo teu corpo terá luz". Mt. 6:22

2 comentários:

  1. aaai que bonitooo, gostei daqui calourinha da minha irma :)))

    voltarei mais vezes, escreves bem.


    beijo!

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  2. "Foi assim que concluí que o olhar, além de janela da alma, é o espelho principal do coração."


    Isso não deixa de ser uma verdade! Bom texto!

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